Conceito de “platô” estabelece nova definição de sucesso no trabalho

Monica McGrath, executiva da área de coaching no segmento empresarial, está sempre atenta às novas tendências. O que ela percebeu foi que diversos profissionais da media gerência relutam cada vez mais em dar o próximo passo em suas carreiras porque a escada corporativa já não é mais tão atraente como no passado, e o preço da escalada é alto demais. “Essas pessoas continuam ambiciosas, e muito empenhadas. Só que elas já não se empenham mais pelas mesmas coisas de 15 anos atrás”, diz McGrath.

Para ela e para outros especialistas, é possível que as pessoas estejam definindo trajetórias profissionais com base em valores e definições próprias de sucesso. Não se trata de indivíduos que já deram tudo de si ou dispostos a abandonar o ambiente de trabalho; eles não pretendem voltar à escola; também não pensam em mudar de carreira; tampouco estão atravessando uma crise de meia idade. O fato é que esses indivíduos estão repensando sua contribuição para a empresa, agora sobre bases pessoais específicas. Em vez de subscrever o lema “em frente e para o alto”, essas pessoas estão mais interessadas em alcançar um determinado “platô”, libertando-se com isso da pressão da escalada estabelecida por terceiros.

Inúmeras tendências muito freqüentes no local de trabalho contribuem para a ocorrência desse fenômeno: os avanços tecnológicos estão pondo por terra as barreiras entre as horas dispendidas dentro e fora do ambiente de trabalho, aumentando a pressão para que o profissional esteja sempre ligado ao trabalho ou de plantão. Decisões estratégicas como as de reestruturação, downsizing e terceirização aumentam o grau de incerteza profissional em todos os níveis, reduzindo o número de promoções disponíveis na alta e na média gerências. O fluxo constante de mulheres que entram para a força de trabalho contribui para elevar o estresse decorrente da necessidade de equilíbrio entre vida profissional e vida pessoal

Lois Backon, vice-presidente do Families and Work Institute (FWI), uma empresa sem fins lucrativos de Nova York especializada em pesquisas na área de família e trabalho, faz referência a um relatório que o FWI publica a cada cinco anos, “Estudo nacional sobre mudanças na força de trabalho”. O último exemplar disponível é de 2003. Uma das áreas de pesquisa diz respeito ao que as empresas chamam de “achatamento das aspirações” entre os vários setores da mão-de-obra. “Trata-se de uma questão da maior importância, com alguns dos dados mais preocupantes para as empresas americanas”, diz Backon.

Em um de seus relatórios mais recentes, “Geração & Sexo (2004), “que utiliza dados colhidos nacionalmente para determinar as diferenças entre as gerações, o FWI descobriu que o número de funcionários que aspirava a posições de maior responsabilidade havia diminuído em relação aos dados anteriores. No segmento masculino com formação superior e constituído por indivíduos da geração Y, X e de meia idade, 68% preferia ocupações de maior responsabilidade em 1992, ante 36% em 2002. Entre as mulheres com formação superior e pertencentes à Geração Y, X, e de meia idade, a queda foi mais acentuada ainda: 57% preferia um emprego com maiores responsabilidades em 1992, ante 36% em 2002. (Considera-se como Geração Y os indivíduos nascidos entre 1980 e 1995; e Geração X, os nascidos entre 1965 e 1980).

“Analisamos então um pouco mais detalhadamente os líderes da economia mundial”, diz Backon. “Pegamos as dez multinacionais mais importantes — empresas como o Citicorp e a IBM — e entrevistamos exaustivamente 100 profissionais da alta administração de ambos os sexos, num total de 200 entrevistas. Desses líderes, 34% das mulheres e 21% dos homens disseram que não cultivavam mais aspirações muito elevadas na vida profissional.

O platô faz parte de um fenômeno que extrapola as fronteiras da força de trabalho — e que inclui também a definição de prioridades mais elevadas em um âmbito de atividades fora da esfera profissional, e que podem ocorrer no lar, em trabalhos voluntários ou na prática de algum hobby. No estudo do FWI, por exemplo, a razão apresentada pela maior parte (67%) desses líderes nas respostas dadas “não foi que não podiam fazer o trabalho, e sim que o sacrifício que isso exigiria de sua vida pessoal era grande demais”, diz Backon.

“Chamamos a esse fenômeno de ‘transbordamento negativo da atividade profissional para o lar’”, acrescenta Backon. “A questão do trabalho excessivo, da necessidade de realização de múltiplas tarefas, de ser obrigado a lidar com inúmeras interrupções durante o expediente” afeta a attitude do empregado, não só em relação ao seu serviço, mas também em relação ao seu tempo livre. “Com base em nossa pesquisa, sabemos que 54% dos empregados não estão totalmente satisfeitos com seu trabalho; 38% estão dispostos a procurar um emprego novo no ano que vem e 39% não se sente suficientemente envolvido com seu trabalho atual.” A maior parte dos empregados “deseja um comprometimento com o trabalho. O termo ‘achatameneto das aspirações’ não siginifica que não tenham talento ou que não sejam bons no que fazem. Nada disso. Contudo, quando participam de grupos focais, dizem coisas como: “Preciso fazer certas opções porque minha família é prioridade para mim’, ou ‘minhas escolhas são feitas de tal modo que minha vida funcione’”.

Uma forma de analisar esse fenômeno, acrescenta Nancy Rothbard, professora de Administração da Wharton, recorre ao fato de que alguns funcionários “ainda obtêm uma certa percepção de identidade decorrente do trabalho, ou estão em busca de outras formas de realização”. Já não estão mais se esforçando para conseguir aumentos; não querem também um quadro maior de subordinados (símbolo de mais prestígio); “esses profissionais estão desviando a energia antes canalizada sobretudo para a consecução de objetivos definidos pela empresa e a estão direcionando para outras áreas”.

Menos promoções, menos pensões

Peter Cappelli, diretor do Centro de Recursos Humanos da Wharton, pesquisou em profundidade a natureza das mudanças no local de trabalho. Conforme suas próprias observações, e as de outros estudiosos, as empresas já não prometem mais estabilidade no emprego, pacote de benefícios generosos e nem mesmo pensões, portanto os funcionários não se sentem na obrigação de ser leais a seus empregadores, como tampouco se sentem obrigados a permanecer na empresa por muito tempo. Esses indivíduos são responsáveis por sua trajetória profissional e procuram consultorias e treinamento que possam ajudá-los a progredir na empresa em que trabalham, ou em outra qualquer.

Cappelli também acha que as empresas “não têm mais tanta influência sobre as pessoas como antigamente no tocante à fórmula empregada para o delineamento dos seus objetivos e aspirações, em parte porque as pessoas chegam a essas ocupações com uma certa idade, e mudam de trabalho com mais freqüência do que no passado. Isto significa então que as pessoas estariam criando sua própria trajetória profissional? Depende do que se queira dizer com isso. Não creio que signifique que elas estejam rejeitando o sucesso na empresa. Contudo, hoje mais do que no passado, esses indivíduos estão avaliando o sucesso de acordo com parâmetros diferentes dos estabelecidos por seu empregador atual”.

Cappelli adverte, porém, que é pouco provável que um funcionário de desempenho “tranqüilo” acredite que sera preservado e valorizado por seu empregador. “Antigamente, bastava deixar correr em ‘ponto morto’ e esperar pela aposentadoria. Isso já não ocorre mais com tanta freqüência.” Embora alguns empregados já não dêem mais tanta atenção aos objetivos colocados pela empresa, “continuam a dar duro porque receiam ser demitidos […] É comum as empresas procederem a avaliações e demitir quem não esteja fazendo sua parte. A capacidade de punir as pessoas e de obrigá-las a se comportar conforme o esperado é uma das maiores lições, também uma das mais desagradáveis, dos anos 80. O moral dos funcionários despencou e a produtividade continuou alta, porque as pessoas tinham medo de ser demitidas”, observa Cappelli, acrescentando, porém, que essa dinâmica muda em um mercado cuja força de trabalho é escassa.

Sara Kaplan, professora de Administração da Wharton, “imagina um cenário em que as pessoas descobrem que não faz muito sentido ser leal a seu empregador. Elas raciocinam então da seguinte forma: ‘Muito bem, cheguei aonde podia chegar, portanto vou me concentrar agora em outras áreas da minha vida. Continuarei a trabalhar, mas não investirei todas as minhas energias no trabalho’”.

Todavia, Kaplan acredita também que “todos precisam de algo que mexa profundamente com seu interior, portanto seria difícil para mim imaginar que as pessoas simplesmente ponham seu trabalho em segundo plano sem antes passar por uma crise ou descobrir outra coisa” que possa interessá-las. A verdade é que a economia atual, acrescenta Kaplan, “não permite ao indivíduo manter seu emprego a menos que ele demonstre um certo envolvimento. As empresas não querem em seus quadros pessoas que não estejam dispostas a ir mais longe. Não querem pessoas que não se esforçam. Não dá para ficar no platô. Há sempre alguém mordendo seu calcanhar”.

A questão da satisfação no trabalho está diretamente relacionada com a questão do perfil desse trabalho. “Especialistas em administração vêm estudando o assunto há bastante tempo”, observa Sigal Barsade, professor de Administração da Wharton. “Sempre que quando uma empresa estabelece as exigências de um trabalho, deve levar em conta de que modo o funcionário vê esse trabalho, se o objetivo do empregado é progredir na empresa, se o trabalho é fundamental em sua vida, e assim por diante. A empresa pode se equivocar redondamente tentando reconfigurar uma função, tornando-a mais enriquecedora, se não for isso o que o funcionário deseja”, principalmente se a nova definição do trabalho exigir que o funcionário trabalhe mais.

O fundamental, diz Barsade, “é que o trabalho permita uma boa adaptação. O indivíduo está fazendo o que a empresa quer que seja feito? Se a resposta for ‘sim’, e se a pessoa for competente no que faz, mas simplesmente não deseja produzir mais do que produz, essa talvez seja uma situação confortável, sobretudo em se tratando de funções que não dêem espaço para promoção”. Isto se aplica principalmente a cargos relacionados com a prestação de serviço ao cliente, em que as pessoas precisam de envolvimento na hora de prestar serviço, mas não se espera delas que imaginem alternativas para a reconfiguração de todo o sistema de atendimento ao cliente. “Portanto, a adequação deve ocorrer levando-se em conta aquilo de que a empresa necessita e aquilo que o empregado quer e valoriza. Se não houver tal coincidência, certamente haverá problemas”.

Em que situações o funcionário que não demonstra interesse algum em progredir ou em aceitar maiores desafios deveria se preocupar com a possibilidade de perder o emprego? “Creio que   enquanto tais empregados trabalharem de forma diligente e competente, mesmo querendo mudar — quer isto signifique o aprendizado de uma nova tecnologia, quer a adaptação a um novo processo de trabalho — estarão seguros”, assinala Barsade.

Trocas

Kathleen Christensen, diretora do Programa Local de Trabalho, Força de Trabalho e Famílias Trabalhadoras da Fundação Alfred P. Sloan, diz que o desejo de alcançar um determinado platô de trabalho e de permanecer nele “é parte natural da vida profissional; entretanto, nós o ignoramos porque temos na mente a idéia de uma trajetória que requer uma escalada constante”. Os psicólogos, diz Christensen, “referem-se a diferentes estágios do desenvolvimento humano. Um deles seria a chegada à meia idade, em que se observa uma sensação de retribuição — um desejo de começar a dar retorno, talvez de começar a cultivar outros em vez de” se concentrar apenas em suas próprias realizações. A idéia de platô pode ser desejável, diz Christensen, uma vez que o funcionário terá a essa altura um bom conhecimento da empresa. Ele provavelmente conhece os processos, é capaz de compartilhá-los com outros e de orientá-los. Se o indivíduo estiver o tempo todo em busca de autonomia, acabará tolhendo a cultura de equipe que toda empresa deseja ter.

Não importa como as pessoas definem seu trabalho, acrescenta Christensen, “é preciso que tenham sempre objetivos que norteiem seu desempenho e que sejam valorizadas com base no grau de satisfação com que atingem os objetivos propostos. Contudo, é preciso que reconheçamos também que em diferentes fases da vida das pessoas, é possível que definam os objetivos de seu desempenho de formas ligeiramente distintas — seu ritmo pode ser diferente  — e ainda assim enquadrar-se nas necessidades da companhia para a consecução de seus objetivos empresariais”.

De acordo com Christensen, o conceito de platô não tem origem única, e pode resultar de determinados acontecimentos na vida do indivíduo — como o nascimento de uma criança ou a necessidade de cuidar do pai ou da mãe doentes —, o que leva o empregado a decidir “a se manter onde está, sem pensar em subir mais”. Contudo, “seria um erro supor que todos os fatores que conduzem a ritmos diferentes de trabalho decorrem apenas de fatores externos. Pode ser simplesmente decisão do funcionário não subir mais” na empresa. Isto não significa que ele esteja acomodado. “Uma pessoa   pode dar duro e ainda assim conservar-se profissionalmente em um platô”, observa Christensen.

Ela enfatiza a necessidade de o empregador e o empregado comunicarem um ao outro suas expectativas e objetivos. A decisão de permanecer no platô, seja por quanto tempo for, deveria ser “uma transação estruturada de tal forma que atenda às necessidades de ambos os lados. É perigoso quando o empregado pensa que pode tomar a decisão baseado apenas no que deseja fazer. Também é perigoso para a empresa se ela não leva em conta do que o empregado necessita par dar o melhor de si. Tudo se resume a princípios de boa administração”.

Anne Weisberg, consultora sênior da Deloitte Services, participa de um programa piloto denominado customização em massa de carreira, que permite ao empregador e ao empregado customizarem juntos a carreira do indivíduo “com base em um conjunto definido de opções”. Isto significa, em outras palavras, que a “estratégia do ‘tamanho único’ não funciona mais”. No programa piloto, iniciado em junho com um grupo de trabalho de 400 pessoas e  que deverá se estender ao longo de um ano, “desmembramos a carreira em quatro dimensões: papel, ritmo, localização e cronograma, e volume de trabalho”. Com relação ao papel, o empregado pode especificar, por exemplo, se deseja um papel externo com interação substancial com o cliente; um papel interno não relacionado diretamente com o cliente, ou um papel cujos requisitos se encontrem a meio caminho entre um e outro. No caso do ritmo, o que está em jogo é a velocidade com que o empregado deseja progredir. Com relação à localização e ao cronograma, analisam-se questões como horas de trabalho de tempo parcial, disponibilidade para trabalhar em casa e disponibilidade para viagens. Já o aspecto de volume de trabalho leva em conta variáveis como o número de projetos que um determinado empregado está disposto a aceitar de uma só vez.

“Cada opção compreende uma troca”, ressalta Weisberg. “Um papel cem por cento interno tem uma estrutura de compensação diferente, bem como uma trajetória diferente. Contudo, as trocas são articuladas, o que permite ao funcionário se deslocar de um conjunto de opções para outro. É um reconhecimetno de que as pessoas precisam adequar seu trabalho à sua vida e a sua vida ao seu trabalho ao longo de sua trajetória profissional, que é de 40 anos. Não há uma solução única” que dê conta de todo esse período. (É interessante observar, diz Weisberg, que o programa piloto constatou até o momento que “em vez de desacelerar a trajetória ascendente de sua carreira, a maior parte dos integrantes do grupo de trabalho está disposta a seguir adiante”, o que reflete, em parte, o fato de que 65% dos enmrpegados da Deloitte têm menos de 35 anos).

A empresa não pode redefinir a escada corporativa “com base em um modelo diferente, porém igualmente rígido”, observa Weisberg. “Temos de substituir a escada corporativa por uma treliça” — um termo que faz referência a um tipo mais maleável de estrutura  que permite ao indivíduo deslocar-se em diferentes direções, e não apenas para cima e para baixo. “Conheço em diversas empresas funcionários que são avaliados com base no número de horas que passam no trabalho ou no número de sacrifícios que fazem pela empresa. Esse paradigma precisa mudar, de modo que se analise o desempenho e a contribuição à parte do sacrifício.”

Weisberg, consultora sênior do Pojeto Feminino da Deloitte, diz que quando o projeto começou, em 1993, a principal preocupação era com a trajetória profissional da mulher, que é muito diferente da do homem.(Por exemplo, a grande maioria das mulheres, cerca de 80%, não trabalha sempre em tempo integral no decorrer de sua vida professional, ao passo que a maior parte dos homens, sim). “Contudo, percebemos rapidamente que questões dessa natureza afetam vários outros grupos, e não apenas o das mulheres, mas também o doshomens, indivíduos da Geração X e Y que talvez   queiram desacelerar mais cedo, porém acabam desacelerando mais tarde, e os chamados baby boomers (indivíduos de meia idade), que porcuram ajustar sua carga de trabalho de modo que consigam acomodar os interesses e responsabilidades que cultivam fora do trabalho. O que falta, diz Weisberg, “é uma forma de aproximar pessoas diferentes de um conjunto consistente de opções”. Em um nível mais objetivo, acrescenta, “trata-se basicamente de uma negociação entre o empregador e o empregado”, razão pela qual é tão importante desenvolver “o tipo certo de estrutura de negociação”.

Ao avaliar o cenário de emprego de 2006, Weisberg diz que há um “aquecimento da disputa pelo talento. Se olharmos para os dados demográficos, notaremos uma escassez enorme em várias das indústrias baseadas no conhecimento. Trata-se de algo que observaremos por um bom tempo ainda”. Weisberg cita uma estatística recente egundo a qual as mulheres constituem agora 58% dos indivíduos com formação superior, uma tendência que deverá afetar ainda mais a forma como são estruturadas as carreiras e os empregos. “Empregadores inteligentes não querem pressionar muito seus empregados, para que não se sintam esgotados. Isso sai caro demais. As estimativas do custo da rotatividade continuam a aumentar, em boa parte por causa do encolhimento da mão-de-obra especializada.”

No passado, segundo Weisberg, “o custo da rotatividade equivalia a 150% do salário. Atualmente, é de 200%”. Alguns especialistas dizem que, no caso das empresas de conhecimento, esse valor é de 500%. “A rotatividade tem um custo alto. Uma das principais razões para a customização em massa de carreira é que esse procedimento melhora o índice de retenção do funcionário.”

Wiesberg salienta também a necessidade de transparência em quaisquer discussões relacionadas com o ambiente de trabalho. No momento em que tanto o empregador quanto o empregado sabem perfeitamente quais as escolhas feitas, “ambos os lados sentem-se mais satisfeitos com a situação. Se as escolhas jamais são discutidas, as expectativas podem não coincidir, provocando estresse em ambas as partes”.

Stewart Friedman, professor de Administração da Wharton, dá aulas para os alunos do programa executivo de MBA da Wharton, além de outros cursos, e também acha que “as pessoas estão se perguntando com o que de fato se importam e como devem mensurar seu sucesso. Creio que um número maior de pessoas, não apenas os funcionários de meia idade, mas também indivíduos mais jovens, estão levantando questões que não levantavam 20 anos atrás. Seria porque um número maior de pessoas estaria se incorporando à pirâmide e com isso aceitando a realidade de expectativas menos ambiciosas decorrentes da menor mobilidade vertical, ou será que fazem parte de uma onda maior de nossa cultura mais centrada em outras definições de sucesso além da definição puramente econômica? Acho que, provavelmente, trata-se das duas coisas”.

O que torna um líder eficaz em uma empresa, diz Friedman, é que ele é capaz de perceber que seus funcionários cultivam valores diferentes do workaholic típico — gente que adora trabalhar 80 horas por semana — e mesmo assim dá sua contribuição à empresa. “Contudo, é difícil mudar normas e valores culturais profundamente arraigados.” O que Friedman descreve como “excessos de uma geração que trabalha além da conta” chegou a um ponto em que “um número cada vez maior de pessoas começa a questionar a dedicação exclusiva ao trabalho. Cresce a quantidade de pessoas que busca alternativas criativas. A grande interrogação 20 anos atrás era saber quem começava a trabalhar mais cedo, já durante o café da manhã. Hoje, a grande questão é saber para onde o indivíduo viajou nas férias e se ele foi para bem longe”.

Horário flexível

Não se sabe ao certo de que maneira a gerência das empresas reagirá aos empregados que redefinem sua ocupação e passam a entendê-la como emprego, e não como vocação ou chamado. “Há o receio de que as pessoas trabalhem simplesmente para cumprir com suas obrigações — isto é, para fazer aquilo que foi especificado, e nada mais”, diz Rothbard. “As empresas morrem de pavor que isso aconteça: elas sabem que as coisas entrarão em colapso quando isso acontecer, porque não se pode especificar tudo o que é preciso ser feito em uma atividade específica. Contudo, creio que se o empregado mantiver sua identificação com o trabalho, não há por que ter receio.”

Outra coisa que precisa ser levada em conta é saber como continuar a motivar as pessoas sem as recompensas tradicionais — como promoções ou uma sala mais ampla. “A empresa pode, inclusive, desejar que seus funcionários tenham outras fontes de realização. Ela se empenhará, então, para introduzir coisas que sejam importantes para eles”, diz Rothbard. Quem sabe permitir a adoção de horário flexível, compartilhamento de atividades, anos sabáticos ou o patrocínio de eventos de caridade que sejam significativos para os funcionários.

Há quem questione a sinceridade de programas como o horário flexível, ou o ano sabático, que permite às pessoas preocuparem-se com seus próprios interesses fora do ambiente de trabalho. “Não creio que as empresas estejam dando a devida atenção às paixões das pessoas. Há programas específicos para isso, mas, francamente, não costumam ser postos em prática com freqüência”, diz Kaplan. Ele observa que as empresas procuram instituir o benefício do horário flexível em períodos de crescimento econômico; entretanto, “basta que as coisas comecem a ir mal para que o programa seja cancelado”. Mesmo quando as empresas colocam em prática programas como o do horário flexível ou o compartilhamento de atividades, acrescenta Barsade, “elas nunca tratam das questões mais importantes, como o volume tremendo de trabalho que as pessoas se vêem obrigadas a realizar”.

Uma dessas questões de grande importância diz respeito ao equilíbrio entre vida profissional e vida pessoal e o comprometimento com o trabalho. McGrath ministrou recentemente um curso de educação executiva para mulheres da média gerência de uma companhia farmacêutica em que explicava a elas como explorar “formas de construir relacionamentos e dar apoio umas às outras à medida que batalhavam para atingir o próximo nível de responsabilidade. Isto se deve ao fato de que as empresas constataram que as mulheres não se mostravam dispostas a ingressar no grupo de funcionários de potencial elevado” por várias razões diferentes — em alguns casos, inclusive, porque queriam reservar tempo para a família. “Eram mulheres que ocupavam postos de vice-presidência. Não lhes faltava ambição, e elas queriam fazer diferença em seu local de trabalho. A questão era saber que volume de responsabilidade a mais elas estavam dispostas a aceitar.”

Rothbard acha irônico o fato de que profissionais que preferem afastar-se por algum tempo do trabalho sejam menos pressionados do que as mulheres que gostariam de fazer um horário flexível, “de modo que pudessem pegar os filhos às 16h e 30 min todos os dias, em vez de pegá-los às 17 h e 30 min”. Rothbard cita o livro de Arlie Hochschild, The time bind [As amarras do tempo], em que a autora descreve as exceções disponíveis para homens de potencial elevado que desejam tirar um ano sabático e viajar pelo mundo. Em um capítulo o livro, Hochschild narra o caso de dois profissionais que pediram afastamento ao supervisor durante algum tempo para se dedicarem à fotografia submarina em recifes de corais. O supervisor concedeu a eles uma licença para fins educativos, de modo que pudessem levar adiante seu projeto. Por que, indaga a autora, a empresa não pode conceder horário flexível aos pais que desejam buscar os filhos mais cedo na creche?

Rothbard faz referência também à pesquisa do fenômeno dos “papéis diversos, e ao fato de que há vantagens físicas e psicológicas para os indivíduos” que tenham mais de uma área em sua vida que requer sua atenção e seu envolvimento. Um exemplo disso seria uma mulher com responsabilidades no trabalho e no lar. A pesquisa estuda “a hipótese da compensação, segundo a qual se algo dá errado em uma área, há uma outra área que compensa aquela que falhou”, diz Rothbard. “Em outras palavras, os papéis desempenhados no trabalho e na família enriquecem um ao outro, em vez de culminar com um duplo exaurimento.”

O estresse no local de trabalho, de acordo com diversos especialistas, pode aumentar em decorrência dos avanços tecnológicos que tornam mais difícil para as pessoas se desligarem completamente do trabalho na hora em que devem fazê-lo, como nas férias, por exemplo. Conforme explica McGrath, “não há limites para o tempo do funcionário. Ele está sempre disponível”. McGrath trabalhou com coaching em cinco empresas de grande porte no ano passado e, em todas elas, notou a existência de volumes de trabalho que considerou impraticáveis. Alguns funcionários, diz ela, reagem tentando estabelecer limites rigorosos para o contato profissional — por exemplo, não respondem ao Blackberry das 6 da tarde às 6 da manhã. “São pessoas que chegaram à conclusão de que jamais conseguirão fazer tudo que lhe pedem e tampouco farão felizes aqueles que as cercam.”

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